segunda-feira, junho 29, 2009

A Senhora do queijo branco

A Senhora do queijo branco.

Já ando a contar os dias. Falta menos de um mês. É mesmo assim, mas, quando chega o verão e o sol aquece os meus dias, começo a pensar nos Açores, todos os meus sentidos me mandam para lá - uma simples relva cortada num jardim e eu "sinto" aquele cheiro dos pastos, tão característico da Ilha, logo de seguida, fico com saudades de ouvir o barulho do mar, perto da minha casa, depois penso nos sabores, no peixe, nos queijos, e, por esta associação na Senhora do queijo branco. Não sei se gosto mais do queijo branco, se da Senhora que o faz. Gosto daquela mulher. Gosto mesmo muito. Nunca lho disse, mas já lhe disse que ela é linda. E é. Parece nórdica, alta, seca de carnes, muito direita, olhos azuis, o cabelo que já foi loiro, muito bem penteado e aquele vestido de flores suaves, sempre absolutamente impecável, como lhe como lhe assenta bem! Tem cerca de oitenta anos e eu morro de inveja dela - tivesse eu aquele porte!

Quando lá vou buscar o queijo branco, como se diz nos Açores (para diferenciar do queijo da Ilha, o de S. Jorge), fico à porta e ela insiste num tom de voz amistoso "entre, entre pra dentro vizinha, não fique à porta". Lá entro, relutante, devagarinho, (naquela sala profusamente decorada de retratos de mulheres e crianças lindas, vestidas de branco, enfeitadas de flores e coroadas de toucados de tule, recordações de casamentos e comunhões, verdadeiras princesas!), como se estivesse a entrar num templo, tal é a limpeza, que ali reina. No verão passado, ao entrar, sofri aquele "murro no estômago" - no sofá, semi-deitado, aquele que em tempos, foi um homem forte e poderoso, o marido, agora como um Cristo decepado, com as duas pernas amputadas por cima dos joelhos .- Está melhor? pergunto, -"já está mais melhorzinho, graças a Deus! Os coriscos dos diabetes deram cabo dele! Mas o que se há-de fazer? É a vontade de Deus", diz-me ela sem revolta nem acinte. Tem cerca de oitenta anos e eu morro de inveja dela - tivesse eu aquela resignação!

Sigo-a até até à cozinha e escuto-a atentamente, enquanto manipula, com precisão e delicadeza, o queijo ainda mole, mudando-o do cincho para a embalagem de plástico, "agora leva umas pedrinhas de sal, deixa-o escorrer até amanhã e já está! Quer algum para amanhã?" Eu quero sempre e olho-a fascinada, tudo nela é delicadeza, elegância, precisão e sabedoria. Tem cerca de oitenta anos e eu morro de inveja dela, tivesse eu aquela competência!

Pergunto-lhe pelos filhos, - "estão todos bem, já esta semana falei com os dois que estão na América e o que está no Canadá telefonou ontem, os outros quatro, a viver por aqui perto, graças a Deus, todos os dias vêm cá a casa ver-nos e tratar do Pai". Quando chego aos Açores procuro-a sempre, por causa do queijo branco, que considero o melhor no género. Um ano não a encontrei, tinha ido para o Canadá ver o filho. Outro ano, disse-me que já não podia fazer mais queijo porque o marido estava internado, no Hospital. Sei que ela também gosta de conversar comigo, e já me contou como educou, os (sete ou oito) filhos, naqueles tempos difíceis: -"eduquei-os com muito rigor, sabe, nem tinha água quente canalizada e dava-lhes banho com água fria, debaixo da torneira do tanque da roupa! Eles ainda hoje falam nisso e riem-se! Tenho muita sorte com os meus filhos! São muito meus amigos! A mais nova deixou de viver na cidade, para vir viver para aqui, só para estar perto de mim e ajudar-me!" Tem cerca de oitenta anos e eu morro de inveja dela - tivesse eu esta Paz!

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6 Comments:

Anonymous Anónimo said...

Também "invejo" muito essa "senhora dos queijos". Acho que lhe devias dizer na próxima vez, que gostas dela.
M.I.

9:04 da tarde  
Blogger Maria Silva said...

Nas "ilhas de baixo" o nome é queijo fresco.
O queijo da ilha é um queijo tipo S.jorge que fabricam em S. Miguel.

10:02 da tarde  
Blogger Rui Coutinho said...

Quando eu era puto, o queijo branco é (era) "queijo de cabra" e o de São Jorge chamava-se "queijo de peso".
Não fales muito da Sra. do queijo porque ela pode ter a inspecção económica à perna.

1:25 da tarde  
Blogger frosado said...

Maracujá, é queijo de cabra mesmo, qt à Inspecção económica, eu não disse em lado nenhum que lho pagava, ela pode oferecer-mo, não achas?

1:42 da tarde  
Anonymous Bruno Rosado said...

Só de ler fiquei com água na Boca, que rico queijo.

7:38 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

se o queijo é de peso, de cabra, da ilha, se é fresco, se é branco, se é tudo isso ao mesmo tempo( é possível),não sei, mas que a senhora deve ser uma pessoa encantadora e soberba fazedora de um queijo excelente, ao ler a tua , vou chamar "carinhosa" crónica, não restam dúvidas.
Da próxima vez que for peço para ir conhecer a sra do queijo branco.
rc

11:08 da tarde  

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